Politica

Governador do RS condena fala de vereador contra baianos em caso de trabalho escravo: ‘nojento’

Sandro Fantinel (Patriota) pediu que empresas “não contratem mais aquela gente lá de cima”, em referência a baianos. Mais de 200 funcionários foram resgatados de alojamento onde eram submetidos a situação análoga à escravidão.

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, condenou, através das redes sociais, a fala do vereador de Caxias do Sul, Sandro Fantinel (Patriota), sobre a repercussão do resgate de trabalhadores em situação de escravidão nas vinícolas da serra gaúcha.

Na terça-feira (28), Fantinel usou a tribuna da Câmara de Vereadores para pedir que os produtores da região “não contratem mais aquela gente lá de cima”, se referindo a trabalhadores vindos da Bahia. A maioria dos trabalhadores contratados para a colheita da uva veio do estado nordestino. Fantinel sugere que se dê preferência a empregados vindos da Argentina, que, segundo ele, seriam “limpos, trabalhadores e corretos”.

A posição de Leite foi contra o “discurso xenófobo e nojento” do parlamentar (veja abaixo).

“Não representa o povo do Rio Grande do Sul. Não admitiremos esse ódio, intolerância e desrespeito na política e na sociedade. Os gaúchos estão de braços abertos para todos, sempre”, disse.

O deputado estadual Leonel Radde (PT) disse que foi registrado um Boletim de Ocorrência contra o vereador.

“Acabamos de registrar um novo Boletim de Ocorrência contra a fala racista do vereador de Caxias do Sul/RS, Sandro Fantinel, que declarou que ‘baianos são sujos e sabem apenas tocar tambor e dançar'”.

O deputado ainda disse que “o Rio Grande do Sul e o Brasil não são lugares para racistas, escravocratas!”

O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT) também se manifestou no Twitter: “Eu repudio veementemente a apologia à escravidão e não permitirei que tratem nenhum nordestino ou baiano com preconceito ou rancor”.

“É desumano, vergonhoso e inadmissível ver que há brasileiros capazes de defender a crueldade humana. Determinei, portanto, a adoção de medidas cabíveis para que o vereador seja responsabilizado pela sua fala”, afirmou o governador.

As declarações do vereador também provocaram respostas de seus colegas de Câmara em Caxias do Sul. Lucas Caregnato (PT) disse que as palavras usadas foram de “cunho xenofóbico, preconceituoso e discriminatório”.

Rafael Bueno (PDT) pediu que a Câmara emita uma nota “pedindo desculpas, porque a gente não comunga com qualquer prática de intolerância, seja com imigrantes ou trabalhadores que procuram nossa região para sobreviver”.

Ao g1 RS, o presidente da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul, José Pascual Dambrós (PSB), afirmou que Fantinel “tem responsabilidade de responder por sua fala”, que, segundo ele, não reflete o pensamento da cidade ou da Câmara. Contudo, não quis se comprometer com uma ação contra o colega. Segundo ele, uma medida contra o vereador só deve ser tomada caso haja representação no Conselho de Ética da Casa.

“A fala de um vereador não representa a cidade. O que representa a cidade é a hospitalidade e a harmonia com que recebemos gente de fora do país e do estado. Mais da metade dos vereadores veio de fora da cidade, precisamos respeitar todo o povo, inclusive temos muita gente de outros municípios, de outras regiões e até de outros países trabalhando na cidade”, avalia.

Na manhã desta quarta-feira (1º), a Câmara emitiu nota informando que “não compactua com nenhuma manifestação de preconceito, discriminação, racismo ou xenofobia”, e que a fala foi um posicionamento individual. Veja nota na íntegra abaixo.

O caso veio à tona na quarta-feira (22), quando três trabalhadores procuraram a polícia após fugirem de um alojamento em que eram mantidos contra sua vontade. Uma operação realizada no mesmo dia resgatou mais de 200 pessoas que eram submetidas a trabalho análogo à escravidão durante a colheita da uva.

Os trabalhadores foram contratados pela Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, que oferecia a mão de obra para as vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi, Salton e produtores rurais da região. A maioria viajou da Bahia para o RS. Eles afirmam que eram extorquidos, ameaçados, agredidos e torturados com choques elétricos e spray de pimenta.

O administrador da empresa chegou a ser preso pela polícia, mas pagou fiança e foi solto. As vinícolas que faziam uso da mão de obra análoga à escravidão devem ser responsabilizadas, de acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

A maioria dos trabalhadores resgatados chegou à Bahia nesta segunda-feira (27). Os demais optaram por permanecer no RS. Quase todos já receberam as verbas rescisórias a que tinham direito, em um valor que, somado, ultrapassou R$ 1 milhão.

Nesta terça-feira (28), a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) suspendeu a participação das vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton de suas atividades. A ApexBrasil é um serviço social autônomo vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, NComércio e Serviços (MDIC), que promove os produtos brasileiros no exterior.

Nota da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul

A Câmara Municipal de Caxias do Sul é a Casa da Representatividade e do Respeito. Por isso, a Mesa Diretora não compactua com nenhuma manifestação de preconceito, discriminação, racismo ou xenofobia.

Em decorrência do pronunciamento do vereador Sandro Fantinel/PATRIOTA em relação a trabalhadores baianos, na sessão ordinária da última terça-feira (28/02), ressaltamos que foi um posicionamento individual do parlamentar. Não traduz o pensamento e os valores da instituição e nem da totalidade dos vereadores.

Também pedimos desculpas ao povo baiano e a todos os migrantes que se sentiram atacados, destacando que são todos muito bem-vindos em nossa Caxias do Sul.

Caxias do Sul, 1º de março de 2023.

Notas das vinícolas

“Em relação às notícias sobre casos de trabalho análogo à escravidão na região de Bento Gonçalves (RS), a Vinícola Salton S.A. esclarece, em primeiro lugar, que repudia veementemente qualquer ato de violação dos direitos humanos e que, em nenhuma circunstância, houve qualquer denúncia ou violação do direito do trabalhador em sua unidade.

A empresa rescindiu imediatamente o contrato com o fornecedor Fênix Serviços Administrativo, responsável pela prestação de serviço em questão, ao tomar ciência do caso, e ressalta que tal contrato visava exclusivamente a carga e descarga e não a colheita da uva, já que a vinícola não tem atividade de colheita em Bento Gonçalves.

A Salton está adotando medidas austeras para que os fatos sejam devidamente esclarecidos, colaborando de forma transparente com as autoridades públicas. A empresa intensificou a fiscalização de fornecedores e prestadores de serviços e está agindo em parceria com as instituições e outras empresas locais na busca de soluções perenes.

A vinícola reitera seus valores sociais e éticos e reafirma que está trabalhando na melhoria e implementação de ações para que ocorrências como estas não se repitam”.

Garibaldi

“A Cooperativa Vinícola Garibaldi protagoniza uma história de 92 anos de atuação, credibilidade e compromisso com a valorização das pessoas. Esse ideal está intrínseco no propósito cooperativista que deu origem ao negócio e, principalmente, segue norteando diariamente todas as práticas da Cooperativa Vinícola Garibaldi, inclusive na sua relação com os mais de 450 associados, pequenos produtores de agricultura familiar, e dos mais de 200 colaboradores diretos.

Alinhada com esses valores, a Cooperativa Vinícola Garibaldi repudia qualquer prática que afronte o respeito ao ser humano ou comprometa sua integridade.

Com surpresa e indignação, a vinícola recebeu as denúncias de práticas análogas à escravidão exercidas por uma empresa terceirizada, contratada para suprir a demanda pontual e específica do descarregamento de caminhões no período da safra da uva. Prontamente, a Cooperativa Vinícola Garibaldi encerrou o contrato de prestação de serviço e colocou-se integralmente à disposição das autoridades competentes para colaborar de todas as formas com as investigações necessárias. Assim pretende seguir até a completa elucidação dos fatos, confiando no exercício da justiça e no respeito à responsabilidade social.

Da mesma forma, presta solidariedade aos vitimados pelo ocorrido e a seus familiares, reiterando que de forma alguma compactua com as práticas denunciadas e jamais aceitará tais conduções em suas relações de trabalho.

Importante salientar que, nesses menos de 30 dias de contrato prestando serviço na Cooperativa, o tratamento foi igualitário aos funcionários diretos, atendendo a todas as normas de convívio valorizadas pela Garibaldi, dentre as quais os horários, treinamento, segurança, refeições, etc., além do atendimento a todas as questões legais pertinentes.

Com a transparência que sempre conduziu suas relações, a Cooperativa Vinícola Garibaldi permanece à disposição da sociedade e das autoridades envolvidas no caso.

Garibaldi, 27 de fevereiro de 2023″.

Aurora

“A Vinícola Aurora se solidariza com as vítimas e repudia veementemente qualquer forma de trabalho que atente contra a dignidade humana.

Nenhum fato relacionado a condição análoga à escravidão aconteceu dentro da Aurora, como foi reforçado na coletiva de imprensa dos órgãos públicos fiscalizadores, em 25 de fevereiro de 2023, em Bento Gonçalves.

Aliás, a Aurora sequer foi fiscalizada pelo Ministério do Trabalho e seus fiscais.

  1. Diante dos fatos, que colidem frontalmente com as normas, valores e preceitos da empresa, a Aurora rescindiu de forma imediata o contrato de prestação de serviços firmado com a empresa terceirizada.
  2. Imediatamente, a Aurora se colocou à disposição das autoridades competentes e vem atuando em conjunto com Ministério Público do Trabalho.
  3. Ainda na sexta-feira (24), a Aurora viabilizou o acordo firmado conjuntamente entre o Ministério Público do Trabalho, o Ministério do Trabalho e a empresa prestadora de serviços para que os valores da rescisão fossem efetivamente pagos aos trabalhadores.
  4. Os relatos dos trabalhadores terceirizados às autoridades públicas confirmaram que a Aurora atendia todas as necessidades no local de trabalho, com alimentação adequada e tempo de descanso.
  5. A vinícola possui diretrizes e processos formalizados para a contratação de fornecedores e prestadores de serviços, com práticas de gestão e acompanhamento do cumprimento da legislação.
  6. Antes da contratação, a Aurora exigiu a apresentação dos contratos de trabalho de cada funcionário da prestadora de serviços.
  1. A vinícola possui uma estrutura de ouvidoria e canal de denúncia, que garantem o anonimato do denunciante, e está amplamente disponível nas dependências da empresa, tanto para colaboradores quanto para fornecedores e comunidade em geral. Nenhuma denúncia foi recebida nestes canais.
  2. A Aurora reforça seus compromissos sociais e éticos que norteiam a empresa e ressalta que tomará todas as medidas cabíveis, com a seriedade e respeito que a situação exige.
  3. De igual importância, trabalhará prontamente, não apenas para coibir acontecimentos com fornecedores e prestadores de serviços, mas também para promover a conscientização das melhores práticas sociais e trabalhistas.
  4. A Aurora ressalta que adotou medidas austeras para que os fatos sejam devidamente esclarecidos, de forma transparente e colaborativa junto às autoridades públicas.

São compromissos assumidos pela Vinícola Aurora:

A) Não contratar mão de obra terceirizada no período de safra;

B) Aperfeiçoar os processos internos de fiscalização com fornecedores, revisando contratos e equalizando medidas que visem inibir e combater práticas que não estejam de acordo com a legislação trabalhista e direitos humanos;

C) Realizar o acompanhamento mais próximo e efetivo sobre práticas trabalhistas junto aos seus fornecedores e prestadores de serviços, de forma recorrente;

D) Buscar auditorias independentes para certificar suas práticas com relação à responsabilidade social;

E) Ampliar a divulgação de seus Canais de Denúncia e reforçar a disseminação das práticas dos seus códigos de conduta e ética;

F) Adotar medidas complementares a partir de novas recomendações de entidades públicas, privadas e órgãos fiscalizadores.

A Vinícola Aurora se compromete publicamente em atuar para que fatos como esses nunca mais aconteçam, e se coloca à disposição para quaisquer dúvidas e esclarecimentos”.

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